6 de maio de 2009

No fundo do poço / Tocando fondo

A crise econômica internacional acertou a Espanha com tudo. Perto de 4 milhões de pessoas, entre espanhóis e imigrantes, estão sem emprego. Isso representa mais de 15% da população de trabalhadores.

Quando cheguei, três meses atrás, a impressão que eu tinha pelas notícias dos jornais era que o país estava à beira do apocalipse, num desespero total, mais ou menos como o mundo de cegos contado por Saramago.

Com o tempo vi que, obviamente, as pessoas não estavam surtando nas ruas.

De qualquer maneira, existe sim uma crise que afeta —e muito— a vida dos espanhóis.

Nas empresas, inclusive no jornal onde eu trabalho, o que mais se vê na hora do almoço são os Tupperwares. As pessoas estão deixando de almoçar fora para comer no trabalho o almoço mais barato feito em casa. Um dos "presentes" do jornal ABC aos seus leitores é justamente um jogo de Tupperwares.

Ainda na alimentação, os espanhóis estão trocando os restaurantes pelos bares de tapas (os tradicionais petiscos espanhóis), que são bem mais baratos. E os restaurantes fazem todo tipo de promoção para atrair a clientela, como a tapa que vem grátis na compra de uma cerveja.

Redes de restaurante criaram o "menu anticrise", com preços mais baixos que os habituais. Outra rede dá comida de graça às quartas-feiras para os desempregados. Basta apresentar o cartão do Seguro Desemprego.

Na mesma linha, a Telefónica oferece descontos de 20 euros na conta de telefone dos desempregados e clubes de futebol dão entradas grátis para as partidas.

Até as tradicionais touradas estão ameaçadas. Os patrocinadores (privados e públicos) não têm mais tanto dinheiro para investir e o público reduz seus gastos com lazer. Várias corridas de toros já foram canceladas.

A lista pública dos empregos disponíveis, aqueles que os espanhóis não costumam aceitar e vão parar nas mãos dos estrangeiros imigrantes —como garçom, tosador e jardineiro—, está cada vez mais curta. Os espanhóis, sem opção, agora estão se vendo obrigados a aceitar o que antes viam como subemprego.

Uma informaçao tragicômica: aumentou nos últimos meses o número de denúncias contra empresas por uso de software pirata. Acredita-se que as denúncias estejam sendo apresentadas por empregados demitidos, como vingança contra os ex-patrões.

Ricardo põe legenda na foto:
Um restaurante se revolta contra o disco furado de quem só fala em crise.

Ricardo conta ao pé do ouvido:
Ainda bem que sou um mero jornalista visitante e não podem me demitir. Os passaralhos estão correndo soltos nas redações espanholas.

Ricardo dá o caminho das pedras:
Se você não sabe o que é passaralho, clique aqui.
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